Governo mexe em regras e diminui ganho da poupança

04/05/2012 09h15m

O governo Dilma Rousseff anunciou ontem a redução da remuneração da caderneta de poupança com o objetivo de abrir espaço para quedas adicionais na taxa básica de juros.

As novas regras de remuneração da mais tradicional e popular aplicação financeira do país mudam a partir de hoje. A Folha havia adiantado a que Dilma tomara a decisão anteontem.

O novo modelo vale apenas para novos depósitos e novas contas -as que já existem seguem com o cálculo de seus rendimentos sem modificações.

Foi criado um "gatilho". A poupança só passa a render menos quando quando a taxa básica do Banco Central, a Selic, for igual ou inferior a 8,5 % ao ano. Hoje ela está em 9%.

Sempre que isso ocorrer, as novas cadernetas de poupança e novos depósitos terão seus rendimentos calculados com base em 70% da Selic, acrescidos da TR (Taxa Referencial, que não muda).

Enquanto a taxa do BC estiver acima desse patamar nada muda, inclusive para as novas poupanças -que continuam a ter uma correção de 6,17% ao ano mais TR, como prevê o modelo atual.

O BC já indicou que deve promover novo corte dos juros na reunião dos dias 29 e 30 -o Planalto espera chegar ao "gatilho" de 8,5% nela.

"A mudança é mínima, e não afeta os interesses e benefícios dos correntistas da caderneta de poupança", afirmou o ministro Guido Mantega (Fazenda). A alteração preserva os atuais poupadores, mas afetará os novos depósitos em relação à realidade atual da poupança

"O Brasil dá um passo fundamental na direção de remover resquícios herdados do período de inflação alta" disse o presidente do BC, Alexandre Tombini.

Caso o juro real (descontada a inflação) chegue a 2%, como é o objetivo declarado de Dilma, o rendimento da poupança para os novos depósitos ficará cerca de 18% menor do que o previsto hoje.

A nova regra, que entra em vigor via medida provisória, foi uma decisão de Dilma para liberar o BC a seguir reduzindo a Selic, que serve como referência para o mercado.

É que, como a poupança tem hoje um rendimento mínimo garantido por lei e seus ganhos são isentos de IR, ela se tornaria mais atrativa que os investimentos em renda fixa com a queda da Selic.

Assim, quem investe em títulos do Tesouro e ajuda a financiar a dívida federal migraria para a poupança, criando dificuldades para o governo.

Dilma fez da redução dos juros sua bandeira. Bancos públicos baixarem taxas, obrigando os privados a segui-los.

Na segunda, ela endureceu o discurso e atacou "a lógica perversa" dos bancos. Isso tudo visa ganhar apoio político à espinhosa decisão de mudar a poupança.

Mesmo o também popular Luiz Inácio Lula da Silva teve de mudar de ideia em 2009, visto que foi acusado de prejudicar o pequeno poupador e deixar os bancos ilesos.

Agora, a oposição teve reações divididas. Os líderes do PSDB na Câmara, Bruno Araújo (PE), e no Senado, Alvaro Dias (PR), atacaram o governo.

"O porto seguro das pequenas economias pagará o pato dessa guerra santa deflagrada pela presidente, que não mostra coragem para mexer no que interessa: tributos e ganhos de bancos", disse Dias, cuja crítica também foi feita pela Força Sindical.

Já o presidente do PSDB, Sérgio Guerra (PE), afirmou que o partido vai encomendar estudo para analisar os a mudança. O mesmo fará a CUT, alinhada ao Planalto.

Colaboraram MÁRCIO FALCÃO e MAELI PRADO, de Brasília, e MARIANA CARNEIRO, de São Paulo

 

 

Dilma diz a aliados que país precisava 'medida ousada' para voltar a crescer

Presidente afirma que não teme perder popularidade e que há 'coisas que precisam ser feitas'

Líder do governo na Câmara afirma que a MP ainda precisa ser aprovada, mas ninguém manifestou resistência

DE BRASÍLIA
 

A presidente Dilma Rousseff disse a sindicalistas, empresários e líderes aliados, em três reuniões distintas no Palácio do Planalto, que a mudança no rendimento da poupança é uma "medida ousada", mas que tinha de ser "enfrentada" para permitir a queda dos juros no país.

Segundo os participantes, Dilma disse não temer perder popularidade e foi elogiada pelos empresários por adotar uma medida polêmica. "São coisas que precisam ser feitas e serão feitas, fomos eleitos para isso", afirmou no encontro com os empresários, o último dos três que teve para pedir apoio à medida.

A primeira reunião foi com o Conselho Político, que reúne líderes dos partidos aliados. Nela, parlamentares lembraram a tentativa frustrada do ex-presidente Lula de mudar a poupança. Bem-humorada, a presidente aproveitou para brincar com o ministro Guido Mantega (Fazenda), que comandava a pasta na época: "É que o Mantega evoluiu muito de lá para cá".

Nas reuniões, Dilma reforçou que o país precisa vencer três entraves para continuar se desenvolvendo: a redução dos juros, a valorização cambial e a carga tributária do país: "Não estou aqui para vender facilidades. Esse é um passo que tem que ser dado".

O último encontro reuniu 26 empresários. Presidente da Confederação Nacional da Indústria, Robson Andrade diz que todos elogiaram a medida, incluindo os banqueiros presdentes: Pedro Moreira Salles (Itaú-Unibanco), Luis Carlos Trabuco (Bradesco) e André Esteves (BTG Pactual).

O presidente do Bradesco, Luiz Trabuco, disse que "foi uma mudança boa para todos, importante, pois preserva os saldos existentes, mantendo as regras de liquidez e isenção tributária, preservando a grande credibilidade deste instrumento, um dos mais populares do país. A mudança foi boa, pois permite espaço para a continuidade na queda dos juros".

Robson Andrade disse que a busca por juros menores não poderá ser feita só por bancos oficiais e afirmou que os demais estão reagindo por conta da concorrência. "Se você não tem concorrência, não tem necessidade de buscar maior eficiência. À medida que bancos tenham concorrência, isso faz com que busquem reduzir os juros."

O líder do governo na Câmara lembrou que a MP terá de ser aprovada no Congresso. "O assunto é importante, mas ninguém manifestou resistência durante a reunião", disse Arlindo Chinaglia (PT-SP), após reunião com Dilma.

 

Mudança pode alterar crédito imobiliário

DE BRASÍLIA
 

A decisão do governo de mudar a regra de remuneração da poupança quando a taxa Selic chegar a 8,5% poderá aumentar o ganho dos bancos nos financiamentos imobiliários.

Se as instituições financeiras não acompanharem a diminuição da taxa de juros e não reduzirem também o valor cobrado nos empréstimos, na prática, elas estarão captando dinheiro no mercado mais barato e cobrando o mesmo preço dos mutuários.

Hoje a poupança é a principal fonte de recursos na área de habitação, e 65% do saldo das cadernetas tem que ser obrigatoriamente direcionado para o setor.

LUCRO

Enquanto numa ponta os bancos pagam aos poupadores, na regra atual, juros de 6,17% ao ano mais a variação da TR (Taxa Referencial), eles financiam a compra de imóveis cobrando até 12% ao ano mais a TR. Isso considerando as operações feitas pelas regras do SFH (Sistema Financeiro de Habitação).

A diferença serve para cobrir os custos do financiamento e o lucro do banco. Se a taxa de captação cai e a de aplicação permanece inalterada, a instituição estará embolsando mais dinheiro com o crédito concedido.

Para o ministro Guido Mantega (Fazenda), com a concorrência no sistema financeiro e a briga pela clientela, os bancos vão "ter que diminuir o custo dos financiamentos".

 

Análise

Dilma assume risco político evitado por seus antecessores

FERNANDO RODRIGUES
DE BRASÍLIA
 

A presidente Dilma Rousseff assume um risco político conhecido e calculado ao modificar as regras da mais popular aplicação financeira no Brasil. Presidente que "mexe na poupança" conhece o espectro que ronda esse tema desde o confisco realizado em março de 1990, há 22 anos, quando Fernando Collor de Mello assumiu o Palácio do Planalto.

Collor desfrutou de uma euforia inicial da população pela sensação ilusória do fim da inflação. Mas o apoio político ao então presidente só diminuiu nos meses seguintes. Sofreu o impeachment com menos de três anos de governo -o país estava mergulhado numa crise econômica e Collor enredado em acusações de corrupção.

Os outros presidentes da República, cada um do seu jeito, discutiram formas de alterar o rendimento da caderneta de poupança. Ninguém teve coragem de ir adiante.

Quem mais se aproximou do que Dilma Rousseff faz agora foi seu antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva.

Em 2009, em meio à crise financeira internacional, o petista sinalizou com uma mexida na poupança. Recuou imediatamente assim que a frágil oposição da época foi à TV e o acusou de tramar um "confisco". Há diferenças, entretanto, entre os cenários do passado e o hoje desfrutado por Dilma.

A taxa de popularidade de Lula em 2009 estava em trajetória ascendente. Só que a economia era uma incógnita. Não estava claro ainda qual seria o efeito da crise internacional, iniciada no ano anterior com a quebra do banco Lehman Brothers, nos Estados Unidos. O petista corria o risco de sair da zona de conforto em que estava. Preferiu deixar tudo no mesmo lugar.

OUTRA SITUAÇÃO

A situação de Dilma Rousseff é outra. Ela também está com sua popularidade em viés de alta. A diferença é o estado da economia. Tudo indica que os brasileiros terão um Natal neste ano mais próspero que o de 2011. Ou seja, se há um momento para queimar capital político mexendo na poupança, a hora é agora.

O gradualismo adotado por Dilma também minimiza o seu desgaste. Quem tinha dinheiro aplicado até ontem não será prejudicado. E a partir de agora, só haverá rendimento menor quando a taxa de juros oficial ficar igual ou abaixo de 8,5% (está no momento em 9%).

O próximo passo é a disputa política de versões com a oposição. A expectativa do governo é que os "efeitos político-psicológicos", expressão ouvida ontem pela Folha, sejam de curta duração. O impacto negativo será eliminado, no desejo do Planalto, quando o benefício de juros mais baixos se espalhar pela população.

Na dúvida, Dilma não se arriscará a ser a cara dessa mexida na poupança. Ela não fará pronunciamento à nação. Deixou o desgaste para seus ministros e técnicos da área econômica.

 

Remuneração só muda para novo poupador

Ministro da Fazenda diz que mudanças farão com que os bancos reduzam as taxas de rendimento dos fundos

Quanto mais a inflação se distancia da meta fixada pelo governo federal, maior é a perda para a poupança

DE BRASÍLIA
 

Com as mudanças definidas pelo governo, um poupador que tem hoje uma caderneta de poupança não terá sua remuneração alterada. Mas se ele fizer novos depósitos esse dinheiro fica sujeito à nova regra definida pelo Planalto. A correção será equivalente a 70% da Selic sempre que o BC fixar os juros básicos num valor igual ou menor do que 8,5%.

Caso o juro real (descontada a inflação) chegue a 2%, como é o objetivo declarado da presidente Dilma Rousseff, o rendimento da poupança ficará cerca de 14% menor do que o previsto pelas regras atuais, considerando as atuais expectativas de inflação no país.

Quanto mais a inflação se distancia da meta fixada pelo governo, maior a perda da poupança. Com a meta de inflação de 4,5%, a poupança vai render 4,6% -contra pelo menos 6,17% previstos na regra atual.

O ministro Guido Mantega afirmou que os 70% da Selic foram estabelecidos pois essa foi a maior remuneração paga pela poupança nos últimos dez anos, segundo levantamento feito pelo governo. "Por isso usamos esse critério para estabelecer a remuneração", declarou.

Segundo Mantega, quando poupadores que fizerem depósitos sob as novas regras forem sacar seus recursos, os bancos terão de priorizar as aplicações mais recentes, que terão um rendimento menor.

O ministro da Fazenda afirmou, ainda, que as atuais mudanças na remuneração da poupança fará com que os bancos reduzam suas taxas de remuneração de fundos de investimentos.

"Eles [bancos] cobram taxas de 4%, 3%, 2% ao ano, o que retira parte da rentabilidade dos fundos de investimento. Com essa concorrência da poupança, as instituições financeiras serão levadas a reduzirem suas taxas de administração", declarou o ministro.

Fonte: Fenacon

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