Na semana que passou, atendendo a um pleito da classe empresarial, a Assembleia Legislativa anulou o decreto do governo do Estado que instituía tratamento excepcional, mediante concessão de remissão e anistia, cumuladas ou não com parcelamento, para liquidação de créditos tributários referentes ao ICMS, apurados em cruzamento de informações de banco de dados. Os empresários reclamavam que a medida do Poder Executivo promovia ainda mais “arrocho” para a classe.
Após sustar o decreto, a Assembleia Legislativa notifica a Secretaria de Estado de Fazenda (Sefaz) para fazer a regulamentação. Do lado do governo do Estado houve uma ponderação sobre o assunto, evitando polemizar.
Os deputados, em sessão extraordinária, na quinta-feira, anularam os efeitos do decreto 3.064, de 15 de dezembro de 2010, que regulamentava a Lei nº 9.434, de 11 de agosto de 2010 do próprio Poder Executivo.
Em entrevista ao Diário, o presidente da Câmara dos Dirigentes Lojistas (CDL), Paulo Gasparotto, ressaltou a importância da união dos empresários para que o decreto fosse anulado.
Gasparotto também critica a carga tributária cobrada pelo governo do Estado, mas ressalta que um dos maiores motivos para que grandes empresas não invistam em Mato Grosso seria a burocracia imposta pela Secretaria de Fazenda (Sefaz).
Segundo ele, o desenvolvimento econômico de Cuiabá e Várzea Grande foi prejudicado nos últimos anos pelas más administrações.
Diário de Cuiabá - O senhor acredita que a anulação do decreto do governo pela Assembleia Legislativa só ocorreu por força e articulação da classe empresarial?
Paulo Gasparotto - Não sei se foi somente por causa disso, mas a classe empresarial lutou para corrigir este decreto. Fomos até o governador Silval Barbosa (PMDB) e dissemos a ele que tínhamos que encontrar uma solução para este impasse, e ele sempre nos recebeu muito bem e tratou com entusiasmo do assunto. Neste período, o presidente da Assembleia Legislativa, José Riva (PP), por decisão própria, reuniu todos os deputados e pediu para que todos votassem na extensão do decreto dando um prazo para a Sefaz (Secretaria de Fazenda) fazer novamente a regulamentação. Isso já está sendo feito. Já conversamos com os técnicos e imaginamos que em poucos dias o governador vai assinar um novo decreto, acabando assim com este conflito que está existindo e dificultando as vidas dos empresários e principalmente das micro e pequenas empresas.
Diário - O fato de ter muitos deputados que também são empresários ou desenvolvem alguma atividade econômica facilitou as conversas para anular o decreto?
Gasparotto - Eu acho que a sensibilidade dos deputados foi atingida por várias maneiras. Mas o que eu mais acredito que nos ajudou a fazer eles tomarem uma decisão foi o apelo de empresários de suas bases eleitorais. Então, o fato de eles acabarem de tomar posse, dar uma resposta para a sua base, era importante. O Riva, por exemplo, tem recebido vários grupos de empresários de todo o Estado com a mesma reivindicação: que a Secretaria de Fazenda não vem cumprindo regularmente o seu papel e dando a atenção que deveria ao contribuinte.
Diário - A quem o senhor atribuiu o “erro” no decreto que foi elaborado em desacordo com a Lei do próprio Poder Executivo?
Gasparotto - Eu acho que não foi um erro do decreto. Eu acho que foi interesse de pessoas que de alguma maneira procuram mudar a finalidade do decreto, que era contemplar a remissão de multa de juros e a anistia de parcelamentos, além de acrescentar outros valores para melhorar a arrecadação do Estado.
Diário - O governo alega que a carga tributária do Estado é a segunda mais baixa do país. A classe empresarial também tem a mesma compreensão?
Gasparotto - Não, não concordamos. Porque a carga tributária de Mato Grosso quando se diz que é a segunda mais baixa do país é porque o Estado pega o PIB (Produto Interno Bruto) de Mato Grosso e divide pela população. Agora, como temos aqui grande parte das empresas do agronegócio com incentivo fiscal, então você cria um PIB grande e divide pela população, parecendo que o imposto não existe, pois logicamente que o imposto é feito em renúncia fiscal e em benefício fiscal. Essa ação é interessante para o Estado, mas por outro lado aparece menos arrecadação, que dividida pela população, aparece uma carga tributária superior de outros estados. A carga tributária de Mato Grosso, eu posso lhe assegurar, não é barata. Pagamos o imposto mais caro de energia elétrica, telefonia e ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços). As micro e pequenas empresas também pagam uma carga tributária superior à de outros estados. Quando falamos ainda de comércio, temos a segurança de que pagamos uma carga tributária tão grande quanto na maioria dos estados.
Diário - O senhor acredita que é possível o governo do Estado reduzir o ICMS da energia elétrica e de outros serviços?
Gasparotto - O comércio mato-grossense é um dos maiores pagadores de energia elétrica do Estado. A indústria também paga muito. Só que o ICMS das indústrias é compensado, pois se credita no valor do ICMS da energia e desconta no que ele tem que pagar. Mas esta exceção não se faz ao comércio. Apesar dos comerciantes serem os maiores consumidores de energia elétrica do Estado, não se credita absolutamente nada do ICMS da conta.
Diário - O senhor defende que um maior número de empresários participe da política?
Gasparotto - O mundo moderno, o 1º mundo, como chamamos, é extremamente corporativo, e acho que no Brasil vai ser assim. A sociedade de modo geral, através de representatividade social, se agrupa e estabelece políticas corporativas elegendo seus representantes para que possam no Congresso ou na Câmara Federal ou na Assembleia Legislativa alinhar os interesses do setor empresarial, junto ao governo. Então assim, eu defendo que nós temos que nos organizar, independentemente de estar na política. Dentro da Assembleia, nós temos que nos organizar politicamente para que possamos fazer frente às enormes dificuldades na área tributária que existe hoje em todo o país.
Diário - O senhor continua filiado ao PR? Por que escolheu o partido?
Gasparotto - Continuo filiado, sim. O PR foi a primeira opção que eu tive de me filiar a um partido político. Eu nunca havia me filiado, em função do convívio político que eu tinha dentro do Estado, com pessoas ligadas à sigla. Achei por bem há alguns anos me filiar ao partido e ocupo ainda o cargo de tesoureiro na Executiva municipal de Cuiabá.
Diário - O senhor acredita que a carga tributária praticada no Estado impede que novas empresas se instalem em Mato Grosso?
Gasparotto – Realmente, escutamos donos de empresas de distribuição de produtos, de medicamentos, alimentos e tantas outras áreas dizerem que não escolhem Mato Grosso para investir não só por causa da carga tributária, mas, principalmente, por causa da complicação tributária do Estado. Quem é de fora não consegue entender como funcionam as cobranças de impostos aqui dentro em função das mudanças que ocorrem quase diariamente através de decretos e de portarias da Secretaria de Fazenda. Temos que contratar nas empresas inúmeros contadores e auditores para poder entender e acompanhar as mudanças no setor tributário. É extremamente difícil hoje ter empresas aqui no Estado.
Diário - A que fato o senhor atribui o crescimento de outras cidades no interior do Estado, a exemplo de Sorriso, Sinop, Lucas do Rio Verde e Primavera do Leste, enquanto em Cuiabá e Várzea Grande se nota um menor desenvolvimento econômico?
Gasparotto - Na verdade o fator econômico tem uma representatividade extremamente forte no desenvolvimento dos municípios. Se analisarmos Primavera, Sorriso, Lucas e Sinop, são as “princesas” de Mato Grosso. O IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) delas tem nível europeu, são cidades extremamente organizadas, cidades novas que também receberam a condição de ser melhor planejadas e obviamente que, em termos de grãos, são extremamente representativas dentro do Estado. E lógico que, acrescido a uma cultura de trabalho diferente, eu acho que faz de estímulo ao crescimento destes municípios.
Diário - O senhor acredita que Várzea Grande tenha condições de se tornar novamente um polo industrial do Estado, como algumas décadas atrás?
Gasparotto - Eu acho que Várzea Grande já é um polo industrial do Estado, pois tem a segunda maior arrecadação de ICMS de Mato Grosso. O problema de Várzea Grande é que não tem tido muita sorte politicamente, e tanto lá quanto Cuiabá passaram os últimos anos com dificuldades políticas administrativas, o que de alguma maneira contribuiu para que grande parte daquilo que se estabeleceu em outros municípios não viesse para cá. Temos que levar em consideração também que Cuiabá é uma Capital que hoje tem vocação muito mais voltada aos serviços do que ao setor industrial. Então, a gente vê com uma expectativa grande em relação ao setor empresarial que está voltado ao turismo, rede hoteleira, rede de transporte de pessoas, na área de formação de profissional, na área de estudos, de faculdades, saúde e gastronomia. Ou seja, Cuiabá está se transformando em um polo interessante com um desenvolvimento muito calcado na área de serviços. Acho que isso é bom para nós, pois é uma vocação da nossa cidade, mas ainda poderia ter sido feito um trabalho muito mais consistente para que isso pudesse contribuir muito mais para o desenvolvimento dos municípios do Estado.
Diário - Qual a contribuição que a classe empresarial tem dado para que haja paralelamente o crescimento econômico do Estado com o aumento do Índice de Desenvolvimento Humano?
Gasparotto - Se analisar o nosso IDH, veremos que há cidades da Baixada Cuiabana com o pior IDH do mundo. Por outro lado, há cidades da região agrícola que têm os melhores do mundo. Eu acredito que em cidades onde o IDH é maior isso acontece em função de parcerias entre a iniciativa privada e o Governo.
Diário - A classe empresarial do Estado ficou satisfeita com as indicações do governo do Estado para os setores de Indústria e Comércio e para a Secretaria de Fazenda?
Gasparotto - Nós procuramos fazer o mínimo de interferência nas indicações que foram feitas pelo governador Silval Barbosa. Eu sei que ele fez o que foi possível, em função de uma base alargada, e eu acho que nessas secretarias as indicações atenderam às expectativas da classe empresarial
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